O principal executivo da General Electric para a América Latina, Daurio Speranzini Junior, e outras 22 pessoas foram denunciadas nesta terça-feira (7) sob acusação de formação de quadrilha e fraude a licitações no Into (Instituto Nacional de Traumatologia) e na Secretaria de Saúde do Rio de Janeiro.
A denúncia do MPF (Ministério Público Federal) é desdobramento da Operação Ressonância, deflagrada no mês passado. Também são acusados o ex-secretário Sérgio Côrtes, o ex-diretor do Into André Loyelo e o empresário Miguel Iskin, apontado como o organizador das fraudes aos pregões internacionais desde 1996.
As acusações contra Speranzini, atualmente preso preventivamente, referem-se principalmente a fatos relacionados ao período em que ele esteve à frente da Philips Medical no Brasil, até 2010. A Procuradoria cita, contudo, caso ocorrido após ele assumir cargo na GE.
Outro executivo da Philips do Brasil, Frederik Knudsen, também foi denunciado.
De acordo com as investigações, Iskin cobrava um “pedágio” de 13% sobre os valores de contratos para fornecimento de próteses e órteses. A comissão cobrada para empresas internacionais chegava a 40%, segundo o Ministério Público Federal.
Compliance conivente na Philips
Grande parte das informações sobre a atuação da Philips no Brasil foi obtida por meio do depoimento de um ex-funcionário da companhia, já conhecidas desde a prisão de Speranzini Junior.
Segundo a Procuradoria, a testemunha relatou ao setor de compliance as fraudes organizadas por Iskin, sem que a empresa tomasse qualquer atitude para evitá-las.
“A conivência de executivos da Philips nas práticas criminosas restou evidenciada pela reação da empresa diante das denúncias, o que, à época, gerou apenas a intervenção administrativa da multinacional junto ao Ministério da Saúde para retirada do nome da sociedade do contrato firmado em decorrência da licitação, sem que fosse apontado o sobrepreço ao referido órgão ou rescindido o contrato firmado com a empresa Rizzi [representante comercial]”, afirma o MPF.
A Procuradoria afirma ainda que Speranzini Junior foi demitido em 2010 “após investigação interna”.
Em e-mail enviado à Philips em 2011, contudo, ele pede proteção legal por “anomalias” que manteve contato à frente da empresa, citando o caso da Rizzi.
O executivo foi contratado pela GE no ano seguinte como gerente-geral de sistemas de saúde. Foi promovido a vice-presidente comercial e executivo-chefe para a América Latina, antes de chegar ao posto de CEO (equivalente a diretor-executivo) no continente.
A Procuradoria afirma que Speranzini Junior “permaneceu atuando junto a integrantes da organização criminosa ao menos até 2015”. Como a Folha de S.Paulo revelou, a GE realizou exportações para o Brasil ao menos quatro vezes por meio de empresas ligadas a Iskin.
A estrutura do cartel foi detalhada por duas empresas em acordo de leniência com o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica). Foram listadas ao Cade 70 licitações afetadas pelo cartel, com o envolvimento de 37 empresas.
O dono da leniente Per Prima, Leandro Carmago, afirmou que a lista de compras no Into era feita de acordo com as prioridades de Iskin, e não das necessidades do hospital. A estimativa, considerada conservadora, é de que os danos aos cofres públicos tenham chegado a R$ 600 milhões.
Outro elemento da investigação é a delação premiada do ex-subsecretário de Saúde César Romero, que também originou a Fatura Exposta. Em depoimento, ele detalhou o cartel que foi adotado na Secretaria de Saúde. O colaborador mencionou 18 multinacionais do setor de saúde.
OUTRO LADO
Em nota à época da prisão de Speranzini, a GE afirmou que a empresa não é alvo das investigações e que está à disposição para colaborar com as autoridades.
“A respeito da operação da Polícia Federal conduzida na manhã de hoje, que resultou na prisão temporária de Daurio Speranzini Jr., esclarecemos que as alegações são referentes ao período em que o executivo atuou na liderança de outra empresa”, diz o comunicado.
Por meio de sua assessoria de imprensa no Brasil, a Philips informou à época que “ainda não teve acesso ao processo, no entanto, está cooperando com as autoridades para prestar quaisquer esclarecimentos quanto às alegações apresentadas, que datam de muitos anos atrás”.
“Os atuais líderes executivos da Philips não são parte da ação da Polícia Federal; um colaborador da equipe de vendas da Philips foi conduzido para prestar esclarecimentos”, afirma em nota. (Folhapress)